segunda-feira, 28 de maio de 2012

Doze minutos

A fornada de chipas recheadas com goiabada ainda não estava pronta. Faltavam doze minutos. Não servia a chipa comum, senhora? Não, não servia. Gosto mesmo é com goiabada. Mas desisti de comprar. Meu filho de oito anos me esperava no carro - e ainda precisávamos passar na escolinha da bebê para buscá-la antes de ir para casa. Já eram seis da tarde. Como é que a loja de conveniência do posto não tinha chipas recheadas já prontinhas, assadinhas?

Voltei correndo para o carro e informei a um Caio desolado que não teríamos as chipas recheadas, porque ainda estavam assando. Passamos pela escolinha e pegamos a Alice, que dormia tranqüila. De lá, fomos direto para casa, para a rotina de todos os começos de noite.

E só em casa me ocorreu o que eu perdi naqueles doze minutos.

Se eu tivesse esperado que as chipas assassem, o Caio teria saído do carro e nós nos sentaríamos junto a uma das mesinhas, ali no posto de gasolina, e ficaríamos esperando juntos. Ele provavelmente me pediria um picolé ou coca-cola. Talvez eu até tomasse uma cervejinha. Olharíamos as revistas e ele me contaria alguma coisa da escola ou suas teorias mirabolantes sobre o campeonato brasileiro, todas conduzindo o Cruzeiro ao título.

Alice esperaria mais doze minutos na escolinha. Aos oito meses e dormindo no bercinho, a espera não faria grande diferença na vida dela. Chegaríamos em casa doze minutos mais tarde, talvez quinze, por conta do trânsito que se intensificaria. E teríamos chipas recheadas no lanche. Quentinhas. Com a goiabada derretendo.

Melhor que as chipas, teríamos ganhado doze minutos inteiros e inesperados de relaxamento e conversa jogada fora, em um programa exclusivo de mãe e filho. Talvez tivéssemos encontrado alguma notícia muito engraçada nas revistas de fofoca, ou então comprado um livrinho de palavras cruzadas ou sudoku.

Eu teria doze minutos a mais de boas lembranças com meu filhote querido, para guardar com carinho quando ele inevitavelmente se jogar no mundo daqui a poucos anos - porque o mundo é um destino pequeno para um menino como ele, que sabe localizar a ilha de Madagascar e a Nova Zelândia, mesmo em um globo de mesa, menor que uma laranja e sem os nomes dos países.

Ele teria doze minutos a mais de lembranças do lado positivo da mãe, que permite picolé no fim da tarde e arruma tempinhos de atenção exclusiva para ele, sem distrações - bem melhor que a lembrança da mãe estressada que entrou no carro reclamando que as chipas iam demorar, cazzo.

Nossa vida iria ficar meio em suspenso por doze minutos, porque deixaríamos a programação de lado e nos permitiríamos apenas viver um pouco, curtindo a boa companhia um do outro. Eu troquei doze minutos de vida improvisada por outros doze, de programação burocrática. E a vida é o que acontece com você enquanto você está ocupado fazendo outros planos, diz a bela música de John Lennon, Beautiful Boy.

Não vou perder tempo fazendo outros planos. Mas é fato que a lojinha de conveninências está lá, no meu caminho de casa, todos os dias. Então, ainda tenho chance de dar uma paradinha e, em vez de descer correndo e pegar a chipa, convidar o Caio para um picolé e revistinhas. Ou posso aproveitar os mesmos doze minutos de fim de tarde com ele de outro jeito, independentemente da lojinha ou das guloseimas. A lição foi bem aprendida: às vezes, doze minutos podem valer muito, muito mais.

Daniela Lepinsk Romio, jornalista em Cuiabá, MT. E-mail: jornalista.daniela@uol.com.br. Esse texto é de 2010, mas eu gosto muito dele! Aprendi a desprogramar as coisas de vez em quando...

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